domingo, 14 de julho de 2013

Comentário à Carta 70 (Capítulo 5 de 5)

Por (MariaVanda -  Ir. Maria Silvia Obl. OSB)
 

                     O Pérólas Finas pede escusas pela demora em continuar com o comentário ao Documento de Igreja – Carta 70- que fora motivado antes pela necessidade de publicar assuntos relativos ao tempo litúrgico daquele momento, que reputamos preferenciais aos temas mais comuns e mais cotidianos.

                    Por isso agora nos ocupamos em dar continuidade ao tema qual já vínhamos nos ocupando.

                   Havíamos, no Capítulo IV, falado sobre a oração do Pai Nosso. Agora é momento de falarmos sobre modos não recomendáveis de se fazer oração.

                    A Carta 70, no Título III, se ocupa desse tema. Faz ela referência dois movimentos reconhecidos como não recomendáveis para a oração e meditação nos tempos contemporâneos, quais sejam: a pseudo gnose e ao messalianismo. Tais movimentos entendiam que o corpo era impeditivo, senão um obstáculo para a elevação da alma, além de mais outros senões.

                   E, de fato, era esse argumento disseminado e às vezes até seguidos por alguns padres do deserto, como é o caso do Monge asceta São Simeão (o estilita), que para atingir os graus da perfeição, mortificava seu corpo, imobilizado a uma coluna por fortes correntes, ficando, pois, exposto a vermes que lhe cobriam o corpo e, caiam ao chão, Simeão pedia ao seu servidor Antonio que os recolocassem no corpo e proferia a seguinte frase: “Comei o que Deus vos deu”). Com tal prática esperava estar mais próximo de Deus. E sua carne consumida cedia lugar somente ao espírito, em exercício de purificação. (Cf. Padres do Deserto, Homens Embriagados de Deus. – Jacque Lacarrière- Ed. Loyola pg. 186/186).

                    Os padres da igreja combateram tal rigor corporal, dando ênfase antes à necessidade de entrega do homem, pelo coração, a oração e a conversão dos costumes, como por ex. podemos citar São João Clímaco, autor ascético do Século VII, (que viveu como anacoreta no Monte Sinai), em Escada do Paraíso.

                    Não somente os Padres da Igreja, mas também os Doutores da Igreja, como por ex. Santo Agostinho apontam ao homem, como o caminho da perfeição, a conversão de costumes, ante a necessidade de observar, com rigor, as três virtudes teologais apontadas pelo Apóstolo Paulo em (1Cor. 13,13): a fé, a esperança e a caridade.

                      A Carta 70, realça o fato do corpo, como matéria, também haver sido criado por Deus, e, portanto, não pode ser mal. E de fato não o é. O corpo é abrigo da alma, E para trilhar com ela o caminho da santidade, como tal, depende primeiro, da graça de Deus; porque o homem não caminha às sós e nem é capacitado com seus dons aleatoriamente. Para termos ou ganharmos determinados dons dependemos da graça e dádiva divinas. E um dos dons que recebemos é o DOM DA ORAÇÃO. E não somente o dom da oração, mas da oração contínua e silenciosa, como pede a MEDITAÇÃO CRISTÃ, tema de nosso trabalho.

                      Então, a graça dos dons, a higidez de corpo, alma e de espírito não são experiências psicológicas. São perfeitas intervenção, infusão mesma, do Espírito Santo e imersão do cristão nos mistérios divinos. Os Padres da Igreja, em combatem a pseudognose, já assim afirmavam, que a união do homem orante com Deus se realiza no mistério, mas de forma especial, através dos sacramentos pela Igreja afirmados.

                     Portanto, a oração perfeita, boa para Deus e para o orante, não depende somente de quem se propõe a fazê-la. Antes deve mesmo o orante se abandonar na seara de Deus, como dizia Santa Teresa D Ávila, ir ao Senhor mesmo que seja apenas para cavocar os seus jardins com grande alegria e vontade.

                     Assim, a meditação cristã, como forma de oração que é, não deve desconsiderar a distância natural que há entre o homem com seu Criador, (guardadas as certezas de que Deus não é nem terrestre, nem limitado, nem apreensível através de conceitos, nem cognoscível, mas antes de tudo escapam a nós o seu mistérios); pode, o meditante cristão, através desse abandonar-se em Deus e ao silêncio, num constante clamor, (vinde Pai ou Maranatha), lhe ocorrer um encontro com Deus, numa experiência única de união espiritual, mas antes totalmente dependente da graça divina.

                    Por isso a Carta 70 rechaça os modelos imitativos da meditação cristã e os reconhecem como errôneos, pois estes afirmam que, pode apenas, através de uma atitude psicológica e puramente humana, se estabelecer uma experiência de Deus e o homem, se este se entregar a tal pratica, como remédio psicológico ou espiritual, e como processo rápido para encontrar Deus.

                    A Carta então afirma que essa tentativa de fusão da meditação cristã, nas comunidades eclesiais, com a não cristã, não é isenta de riscos e erros; isto porque umas, só buscam uma preparação psicofísica para uma contemplação cristã e outras, porque procuram produzir por técnicas diversas, experiências espirituais análogas àquelas que se mencionam nos escritos de certos místicos católicos; e outras que se afirmam numa figura do absoluto, como equivalentes à majestade Deus revelada em Cristo, o que não se coaduna com o magistério da Igreja, pois esta se afirma na crença das obras salvadora realizadas na história constante da Tradição cristã, assim como a firmeza na crença do nosso Salvador Jesus Cristo e da Santíssima Trindade, consolidada da nova e eterna aliança firmada por Ele em imolação na cruz.

                    A proposta da Carta 70 para uma harmonização entre a meditação cristã e as meditações análogas é de que, para uma boa coexistência, se examine bem os critérios e métodos dessas outras técnicas e, de forma cuidadosa e bem discernidas de seus conteúdos, possa se evitar cair a Igreja Católica no que denomina de um pernicioso sincretismo.

                   Portanto, não se trata aqui de se rejeitar esta ou aquela forma ou técnica de se meditar, orientada por quaisquer que sejam seu matiz, oriental ou ocidental. Trata-se, essencialmente, de informar o cristão ligado à Igreja Católica Apostólica Romana, de que esta possui sua maneira própria de meditar, fundada no Magistério da Igreja e da fé que professa e, portanto, segundo os critérios da sua Tradição e os fundamentos Apostólicos que prega, emergentes, estes, das Sagradas Escrituras, portanto tendo centro Cristológio.

                     Bebemos, também, das fontes doutrinais dos Padres do Deserto, dos Padres e Doutores da Igreja e, ainda, das vidas dos Santos e Mártires, que nos legaram inúmeros exemplos de entrega e persistência na vida de oração e no “sentire cum Eclésia”. E todos, colhendo benefícios inenarráveis, somente possíveis àqueles que seguiram e observaram,com grande esmero, o caminho de Cristo, de cujos exemplos a história é testemunha.

                      Apenas para não deixarmos o leitor sem exemplos, anotaremos alguns quJESUS e, a própria Carta 70 faz referência, mas que podem ser outros acrescentados, sem qualquer possibilidade de esgotá-los, ante o rol imenso que existe. Santo Antão, São Pacômio, São Macário, Santa Marana, Santa Cira, São Bento , Santo Agostinho, Santa Mônica, Santa Teresa de Ávila, Santa Catarina de Sena, Santa Faustina, S. João da Cruz dentre inúmeros outros.

                    Finalmente, e dando por encerrado o comentário a que nos propusemos, ressaltamos que a Carta 70 é documento da Igreja que trata da Meditação Cristã, mas faz uma abordagem profunda e teológica de outros aspectos eclesiais, aspectos estes que completam e se somam àqueles mais específicos da meditação e da vida do cristão.

                     Queremos agradecer as visitas à matéria, que certamente não se esgotará por aqui, dada a sua importância para a vida cristã e na necessidade daquele que pretende levar uma vida de oração, para se aperfeiçoar no caminho da conversão, tendo como primazia o Caminho de Jesus, para chegarmos ao Pai.


                     Um abraço fraterno.
                      Maria Vanda

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