domingo, 21 de setembro de 2014

A história de uma cana de bambu

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 *Artigo de A. Torres Neiva

Era uma vez, não me lembro bem onde. Só sei que havia lá um lindo jardim que só de vê-lo era um sonho. Ficava ali mesmo, em frente da casa do senhor, que não resistia à tentação de passar por ali todas as tardes a saborear a brisa e a sombra. No jardim, quase ao centro, uma cana de bambu chamava logo a atenção. Alta, elegante, bela como poucas. Não admira que o senhor tivesse um fraco por ela.

Por ser bela, mas talvez também por crescer mais que todas as outras plantas, talvez por se manter retilínea e graciosa, não obstante os ventos do inverno e os calores do verão. A cana bem sabia desta preferência do seu senhor e toda se lisonjeava. Um belo dia, o senhor aproximou-se dela, um pouco constrangido, como se tivesse más notícias para dar. E quase sem levantar o olhar, disse-lhe timidamente :

- ‘Caro bambu, preciso de ti.’ Foi uma maravilha.

- ‘Senhor – diz o bambu, feliz como nunca – sou todo teu; faz de mim o que quiseres.’ Bom de ouvir, se não fosse o que vem a seguir :

- ‘Bambu – o senhor não sabia mesmo por onde começar – para usar os teus serviços, vou precisar de te abater.

- ‘Abater-me?’ O senhor não podia estar falando sério. Então para que fizera dele a mais  bela árvore do seu jardim? ‘Não, por favor, tudo menos isso.

O senhor não se zangou. Quem é que aceita uma coisa destas sem espernear? Mas também não desistiu.

- ‘Meu caro bambu, se não te abater, não posso usar-te.

E ficaram os dois em silêncio, sem nenhum saber o que dizer. Até o vento parou e os pássaros se detiveram sem um pio para cantar. Lentamente, muito lentamente, o bambu inclinou as folhas, lindas que nem sei, e disse, muito baixinho, quase como um segredo que custa dizer :

- ‘Senhor, se não podes usar-me sem me abater, faz de mim o que quiseres e está bem, abata-me.

- ‘Meu caro bambu – disse de novo o senhor – eu ainda não te disse tudo : não devo só abater-te, mas preciso tirar-te as folhas e os ramos.

- ‘Ó senhor, não me faças isso; deixa-me ao menos as folhas e os ramos. Sem folhas e sem ramos, que farei eu no jardim?

E outra vez o senhor :

- ‘Se não posso tirar-te as folhas e os ramos não poderei usar os teus serviços.

Então o sol não quis ouvir mais e escondeu-se; e os pássaros fugiram do jardim para não saberem do resto. E a tremer, o bambu conseguiu ainda dizer :

- ‘Está bem, senhor, corta-as.

- ‘Meu caro bambu, tenho ainda uma coisa que me custa muito a pedir-te. Terei que cortar-te em dois e tirar-te o miolo. Sem isso não poderei usar-te.' 

O bambu já não pôde falar; inclinou-se por terra e ofereceu-se todo ao seu senhor. Assim o senhor do jardim abateu o bambu, tirou-lhe os ramos e as folhas, partiu-o em dois e extraiu-lhe o miolo. Depois levou o bambu para junto de uma fonte de água fresca que ficava perto dos seus campos, que há muito morriam de sede, ali à beira da fonte. E com todo o carinho, ligou uma ponta do bambu à fonte e a outra ao campo. A fonte dava água, o bambu começou a levar a água para o campo que há tanto tempo esperava por ela. E o campo começou a reverdecer.

Quando a primavera chegou, o senhor semeou ali arroz e os dias foram passando até que a semente cresceu, o tempo da colheita chegou e o senhor pôde alimentar toda a sua casa. Quando era grande e belo e gracioso, o bambu vivia e crescia só para si e gostava de se ver assim, esbelto e elegante. Agora, humilde e deitado por terra, tinha-se transformado num canal que o senhor usava para alimentar a sua casa e tornar fecundo o seu reino.


Fonte : 
* Artigo adaptado de Vida Consagrada, 264 – Janeiro 2004, do Padre Adélio Torres Neiva, C. S. Sp. (missionário espiritano (+2010)).

Revista Beneditina nrº 8, Janeiro/Fevereiro de 2005, editado pelas monjas beneditinas do Mosteiro da Santa Cruz – Juiz de Fora/Minas Gerais.


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