segunda-feira, 30 de maio de 2016

Salvar vidas humanas

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)


‘Realizou-se no início desta semana, mais precisamente nos dias 23 e 24, respectivamente segunda e terça-feira, em Istambul, na Turquia, a 1ª Cúpula Humanitária Mundial. 175 os países presentes, entre os quais a Santa Sé, - 55 chefes de Estado, seis mil os participantes, também o setor privado – para falar sobre os milhões de pessoas em fuga de guerras, violências, calamidades naturais, perseguições e mudanças climáticas. Predominou, contudo nas conversas, o conflito sírio, com suas centenas de milhares de mortos e seus milhões de refugiados.

Aumentando o olhar falou-se ainda sobre os 60 milhões de deslocados ou refugiados existentes no mundo; falou-se sobre os 125 milhões de pessoas que hoje dependem de ajudas de doadores internacionais para poderem sobreviver.

Todos chamados a repensar o modo como são administradas as ajudas humanitárias, partindo precisamente do dramático dado que os doadores contribuíram no último ano com menos de 50% dos cerca de 20 bilhões de dólares solicitados pelas Nações Unidas para a sua ação humanitária. A esse importante encontro, o primeiro em absoluto sobre o tema, o Papa Francisco decidiu enviar uma Delegação de alto nível, guiada pelo Secretário de Estado, Cardeal Pietro Parolin.

Já no último domingo, durante a oração mariana do Angelus com os fiéis reunidos na Praça São Pedro, Francisco se referiu a esse importante evento que tinha como objetivo, refletir sobre as medidas a serem tomadas para responder às dramáticas situações humanitárias.  O Papa pediu empenho para realizar o objetivo humanitário principal : ‘salvar a vida de cada ser humano, sem exceção, especialmente os inocentes e os mais indefesos’.

Francisco também enviou uma mensagem, lida pelo Cardeal Parolin, na qual voltou a expressar o conceito de que ‘a nenhum refugiado seja negado acolhimento’. ‘Não deve haver famílias sem casa, refugiados sem acolhimento, feridos sem curas, nenhuma criança tenha sua infância subtraída; nenhum homem e nenhuma mulher devem ser privados do futuro, não pode haver idosos sem uma velhice digna’.

E deu uma luz para salvar vidas humanas: fazer escolhas corajosas em favor da paz, do respeito, da cura e do perdão. ‘Ninguém ama um conceito, ninguém ama uma ideia – escreveu ainda o Papa - nós amamos as pessoas’. Além da luz um desafio : ouvir o pranto das vítimas e daqueles que sofrem. ‘Deixemos que nos deem uma aula de humanidade. Mudemos o nosso estilo de vida, a política, as decisões econômicas, os comportamentos e atitudes de superioridade cultural’, acrescentou o Papa. ‘Aprendendo das vítimas e daqueles que sofrem, seremos capazes de construir um mundo mais humano’.

Mas depois de todas essas palavras e incentivos do Papa, o que sobrou desses dias de encontros e conversas? A reunião de Cúpula, desejada pela ONU, encerrou-se na terça em meio a tantos interrogativos e muitas perplexidades. Iniciando pela real futura aplicação das promessas feitas em auxílio de milhões de pessoas que sofrem devido a crises humanitárias no mundo, para chegar às cadeiras vazias durante o evento.

Sim, porque os grandes ausentes deste encontro foram principalmente os líderes dos países ricos. Um vazio duramente criticado pela liderança da ONU, apesar da grande presença mundial; sim faltaram os chamados líderes do G7, dos sete países mais industrializados do mundo. A exceção foi a chanceler alemã, Angela Merkel.

Apesar da não presença dos ‘grandes da terra’, o sentimento dos presentes foi da necessidade de dar passos importantes. A ausência deles não deve jamais ser uma desculpa para não fazer nada no campo humanitário. Primeira ação concreta : o corte de cerca de 1 bilhão de dólares ao ano nas despesas de gestão da ONU e garantir que a maior parte dos fundos possa ir em ajuda às pessoas mais necessitadas. As despesas gerais das agências de ajuda da ONU agora absorvem cerca de 15% dos financiamentos.

Essa 1ª Cúpula Humanitária Mundial procurou responder à emergência em que nos encontramos. Vivemos um período, talvez o mais complicado desde o fim da Segunda Guerra Mundial, no que diz respeito às relações humanas, nas crises, no número de refugiados, nos desastres causados pelo homem e pela natureza. Por isso é de suma importância partir dessa realidade e procurar respostas concretas baseadas na solidariedade.

O primeiro ponto é reconhecer que somos parte de uma só família humana, por isso há uma responsabilidade coletiva de enfrentar esses problemas que estão se acumulando – violências, crises econômicas – já definidos pelo Papa, ‘uma terceira guerra mundial em pedaços’.

Diante destas crises, uma multidão de vítimas; pessoas excluídas, descartadas que merecem uma resposta. O evento desta semana deveria exatamente ir nesta direção para encontrar novas estradas para evitar novas violências, sofrimentos e desastres ambientais. Devemos buscar, todos juntos, como sociedade, como família humana, respostas.

O importante – como disse o Cardeal Parolin - é ‘não ficar só na política’’, mas superar também as tensões ou as diferenças que existem e se encontrar unidos nas questões fundamentais.

O encontro fez esse esforço de ir além, além das posições, das diferenças, das contraposições políticas para dar uma resposta humana e solidária às necessidades de tantos homens e mulheres que sofrem. Esperamos que as declarações de intentos pronunciadas pelos líderes políticos presentes se traduzam em ações concretas.’


Fonte :
* Artigo na íntegra


sábado, 28 de maio de 2016

Jubileu da Misercórdia : Diácono, modelo para a comunidade

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)



‘Diáconos e suas famílias, de todo o mundo, participarão de uma peregrinação a Roma, de 27 a 29 de maio, por ocasião do Jubileu Extraordinário da Misericórdia.

O lema do Ano Santo, Misericordioso como o Pai, extraído do Evangelho de Lucas, é um convite a seguir o exemplo misericordioso do Pai : não julgar ou condenar, mas perdoar e amar, desmedidamente.

O Encontro mundial dos diáconos, homens que por vocação e ministério são diretamente ligados às obras de caridade na vida e na comunidade cristã, terá seu á pice na celebração eucarística às 10h30 de domingo, 29 de maio, na Praça São Pedro, presidida pelo Papa Francisco.


Realidade brasileira

No Brasil, a Comissão Nacional dos Diáconos, CND, promove o XIV Encontro Nacional de Diretores e Formadores de Escolas Diaconais de 30 de maio a 2 de junho, em Palmas, Tocantins.

Os objetivos do evento serão ampliar cada vez mais a competência para o desempenho do ministério diaconal; formar diáconos para atuar nas novas fronteiras da missão, e preparar os diáconos para atuar numa Igreja em saída em missão.

O nosso convidado é o Presidente da CND, Zeno Konzen, diácono permanente da Diocese de Novo Hamburgo no Rio Grande do Sul.

Primeiramente, ele nos fala sobre a missão concreta do diácono na Igreja.

O diácono deve ser modelo para a comunidade, modelo de comportamento, de pureza, de vida, modelo de mansidão e humildade, modelo de fé e caridade. O paradigma, o ponto de referência para a vida e ministério do diácono é Cristo, o Diácono por excelência. É Jesus mesmo quem diz : ‘O Filho do Homem veio para servir’, para ser diácono. Que cada um desses novos diáconos possam dizer, a cada dia: ‘Eu estou no meio de vós como aquele que serve’.’


Fonte :
* Artigo na íntegra


quinta-feira, 26 de maio de 2016

Escravos do cobalto

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

*Artigo de Marco Simoncelli,
Jornalista

Nas minas da República Democrática do Congo homens, mulheres e crianças explorados trabalham extraindo o cobalto que é usado na produção das baterias recarregáveis de lítio. Sob acusação estão 16 multinacionais entre as quais Apple, Microsoft e Sony, acusadas de não controlar a sua linha de fornecedores.


‘Todos nós fazemos hoje uso de telemóveis, tablets, computadores portáteis e outros dispositivos electrônicos móveis. E todos nós, muitas vezes, praguejamos por causa da escassa duração das baterias de lítio recarregáveis que os fazem funcionar. Poucos de nós, porém, têm consciência de que o cobalto, elemento graças ao qual se consegue produzir essas baterias, é obtido por meio do trabalho mal pago e desumano de adultos e crianças nas minas da República Democrática do Congo (RDC).

De um estudo conjunto publicado pela Amnistia Internacional e pela Afrewatch, conclui-se que as principais empresas de electrônica, entre as quais Apple, Samsung e Sony, não fazem os devidos controlos de base para garantir que o cobalto usado nos seus produtos é extraído respeitando os direitos humanos e não passa pela exploração e trabalho infantil.

O relatório, intitulado «Isto é o que nos mata : Abusos dos direitos humanos na RDC alimentam o comércio global de cobalto», percorre o caminho que o cobalto faz desde as minas na RDC, onde homens e crianças menores de sete anos trabalham em condições extremamente inseguras e prejudiciais à saúde, passando pela laboração para obter as baterias até à sua utilização final nos produtos das grandes marcas de electrónica que encontramos nas lojas.


Trabalho desumano

Mais de metade do total do fornecimento mundial de cobalto provém da RDC e segundo as estimativas do Governo congolês, 20 por cento deste elemento atualmente exportado é extraído por mineiros artesanais na região do Katanga, na parte meridional do país. Trata-se, portanto, de uma parte muito significativa. Não é por acaso que o número dos mineiros artesanais nesta região se situa entre 110 mil e 150 mil. Estes trabalham em paralelo com as atividades industriais muito maiores geridas por empresas ocidentais e chinesas.

Num país como a RDC, entre os mais pobres do mundo (136.º em 188 no Índice de Desenvolvimento Humano da Unicef) e ainda instável por causa dos conflitos étnicos internos e da ausência de instituições estatais fortes, os minerais preciosos representam a única fonte de sustento para muitas pessoas que o extraem autonomamente e sem licença. Isso acontece ou escavando túneis profundos com simples cinzéis, sem ventilação nem medidas de segurança, ou peneirando sem licença os materiais de entulho das minas industriais da região. A exposição crônica a poeiras que contêm cobalto pode causar doenças, asma e redução da função pulmonar. As derrocadas nos túneis artesanais são frequentes e provocam centenas de mortes por ano.

Um dado alarmante é o que diz respeito ao trabalho e à exploração infantil. A Unicef calculou que, em 2014, no setor mineiro da RDC trabalhavam cerca de 40 mil meninos e meninas, muitos dos quais no ramo do cobalto. As crianças entrevistadas pelos investigadores da Amnistia disseram ter trabalhado até 12 horas por dia nas minas, ganhando em média um ou dois dólares. Estes menores não frequentam a escola porque as suas famílias não podem pagar as propinas escolares e são por isso empregados nas mesmas tarefas dos adultos, prejudicando a sua saúde e pondo em risco a própria vida.


Falta empenho, mas também regras

Incúria e indiferença dolosas, ditadas pelas vantagens lucrativas que se obtêm. Compra-se o indispensável cobalto sem fazer perguntas sobre onde e como é extraído, o importante é que se continue a produzir a baixo custo. Esta é sem dúvida a principal explicação.

Mas também é preciso ter em conta que não há nada que obrigue as empresas a fazê-lo. Existe de fato uma enorme lacuna no sistema do direito internacional. Como sublinha a Amnistia, hoje não existe um regulamento do mercado global do cobalto, que não está sequer inserido na lista dos «minerais dos conflitos», a qual compreende pelo contrário ouro, coltan, estanho e volfrâmio.

A Amnistia é clara sobre o que devia ser feito : as empresas não deviam boicotar a produção mineira da RDC, mas fazer um aprofundamento meticuloso sobre os seus fornecedores diretos e indiretos, impondo o respeito dos direitos humanos. A RDC deveria regularizar as áreas mineiras não autorizadas e fazer respeitar as normas sobre o trabalho, especialmente o infantil. Por fim, os Estados de residência fiscal das grandes multinacionais e o mercado global, que deviam aprovar normas conjuntas para obrigarem as empresas à transparência sobre as suas cadeias de abastecimento. Mas o que falta é vontade.


O percurso do cobalto

Do estudo da Amnistia ficou claro que a maior empresa no centro deste comércio na República Democrática do Congo é a Congo Dongfang Mining International (CDM), detida em 100 % pela chinesa Zhejiang Huayou Cobalt Ltd (Huayou Cobalt), um dos maiores produtores no mundo de cobalto. A CDM e a Huayou Cobalt trabalham depois o cobalto antes de o vender a três produtores de componentes de baterias de lítio : Ningbo Shanshan e Tianjin Bamo, na China, e L&F Materials, na Coreia do Sul. Por sua vez, estas empresas vendem as suas mercadorias aos produtores de baterias, os quais as distribuem depois às mais importantes marcas de electrônica ou de automóveis que todos nós conhecemos.

Uma vez feita esta reconstrução, a Amnistia contatou dezesseis multinacionais, que são clientes das três empresas que produzem baterias para aparelhos electrônicos e para automóveis utilizando o cobalto proveniente da Huayou Cobalt ou de outros fornecedores da República Democrática do Congo : Ahong, Apple, Byd, Daimler, Dell, HP, Huawei, Inventec, Lenovo, LG, Microsoft, Samsung, Sony, Vodafone, Volkswagen e Zte. Destas, uma admitiu a relação, quatro responderam que desconheciam isso, cinco negaram usar cobalto da Huayou Cobalt, duas recusaram a evidência de fornecer-se de cobalto da República Democrática do Congo e seis prometeram investigações. Nenhuma das dezesseis empresas foi capaz de disponibilizar informações pormenorizadas, sobre as quais poder desenvolver investigações independentes para compreender de onde vem o cobalto usado nos seus produtos.

Um resultado opaco em termos de transparência que não pode senão evidenciar a situação paradoxal e hipócrita (dado que algumas destas empresas se vangloriam de ter uma política de tolerância zero face ao trabalho infantil). Como é possível que algumas das mais ricas e inovadores empresas do mundo não tenham conhecimento da cadeia de abastecimento das matérias-primas dos seus produtos?’


Fonte :
* Artigo na íntegra


quarta-feira, 25 de maio de 2016

Tráfico humano e migrantes preocupam Igrejas no Golfo Pérsico

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)


‘A Fraternidade de Igrejas do Golfo Pérsico, em conjunto com o Conselho de Igrejas do Oriente Médio, realiza um encontro de treinamento de agentes sociais sobre o trabalho dos migrantes e tráfico de pessoas.

Trata-se de um encontro ecumênico que acontece nas dependências da Igreja Anglicana de Santo André, de 23 a 25 de maio. Os participantes de cada Igreja tentam criar formas de colaboração, dentro e além das fronteiras de cada país da região.

De acordo com o missionário scalabriniano Padre Olmes Milani, os cristãos acreditam que, devido à inexistência de instituições e leis eficientes na defesa das vítimas do trabalho e tráfico, ‘as Igrejas podem ter um papel especial e necessário’.


Legislação

Além de compartilhar modelos de ações e experiências vividas no Oriente Médio, os participantes debruçam-se sobre a legislação referente às questões trabalhistas e tráfico de pessoas de cada país e tentam procurar métodos para identificar vítimas de tráfico humano.

Embora reconhecendo que nos últimos anos os países do Golfo Pérsico fizeram progressos consideráveis, os participantes estudam acordos de cooperação internacional e a possibilidade de criar políticas relacionadas com os problemas em questão.


Traficantes

Outra finalidade do encontro é criar a consciência para a necessidade de programas de reabilitação e despertar as consciências no sentido de proteger as vitimas e levar a julgamento os traficantes.

As Igrejas realizam um trabalho discreto, mas valioso com as ‘janelas’ que as leis dos países do Golfo Pérsico permitem’, escreve o missionário scalabriniano, que desempenha sua missão em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos.


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terça-feira, 24 de maio de 2016

Um seminário em Roma - Contra a violência sexual

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)



‘A reunião teve lugar a portas fechadas, num lugar afastado de Roma, porque muitas das religiosas e religiosos participantes arriscariam a vida, se se soubesse o que fazem. E, contudo, compreendeu-se que a arriscam de igual modo. De fato, é muito perigoso procurar defender as mulheres em países nos quais domina incontrastada a guerra civil, que comporta uma violência contínua e inexorável : um capuchinho congolês falou de trezentas mulheres por dia só na sua região. Trata-se de uma realidade terrível, da qual não se fala muito, ou então é mencionada só para dizer «sempre foi assim». E fala-se ainda menos de quem procura remediar a esta tragédia.

Foi a baronesa Anelay of St. Johns, ministra e representante especial do primeiro-ministro britânico para a prevenção da violência sexual nos conflitos, quem quis este encontro, organizado pelo embaixador da Grã-Bretanha junto da Santa Sé com a ajuda do Pontifício conselho «Justiça e Paz». A baronesa afirmou que só unindo os esforços se pode obter algum resultado tangível, e que é necessário não só assistir as vítimas e ajudá-las, mas trabalhar para transformar o contexto cultural no qual vivem, onde as violências são removidas e escondidas, e as mulheres induzidas ao silêncio.

E sobretudo é necessário combater contra a impunidade que quase sempre protege os violentadores, nunca punidos pelos seus crimes. Esta impunidade, obviamente, mais não faz do que favorecer o reiterar-se da violência. Por isso a ministra britânica elaborou um protocolo – assinado por 140 países – que contém instruções pormenorizadas para iniciar as investigações, a fim de proteger as testemunhas e as mulheres que aceitam falar, para ajudar advogados e juízes a enfrentar um problema para o qual não foram preparados. Em muitos países mais a risco a difusão do protocolo foi acompanhada por cursos especiais para advogados e juízes, de maneira a pô-los em condições de tratar um tema que para eles é novo, e a fim de encontrar e neutralizar os juízes corruptos. A punição dos culpados dá às mulheres a força de falar, de revelar a violência sofrida, e ajuda-as a não se sentirem culpadas do que aconteceu.

Em suma, trata-se de um trabalho complexo de transformação cultural, para fazer compreender a todos, sobretudo às mulheres, uma realidade inegável : elas são pessoas dignas de respeito e, mesmo se foram objeto de violência, têm o direito de participar na vida comunitária, de viver no seu país e com as suas famílias. É um trabalho cultural que serve ainda para fazer face ao perene conflito de maneira mais ativa : de fato, com as violências contínuas, os bandos de predadores mantêm populações inteiras em estado de sujeição.

O protocolo refere-se apenas a casos de violência ligados aos conflitos, mas sabemos que não há só estes. Com efeito, se as mulheres reencontrarem a confiança em si mesmas, se aprenderem a falar e a denunciar, conseguiremos pôr fim também aos abusos cometidos no âmbito das próprias instituições, de todas as instituições.

A narração de tantas experiências corajosas, de tantas vidas heroicas desconhecidas, ofereceu uma imagem da Igreja diversa daquela que estamos habituados a ver : uma Igreja disposta a tudo para defender os mais débeis, uma Igreja capaz de mudar o mundo. Foi a esta Igreja que a baronesa Anelay pediu colaboração. E obteve-a.


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domingo, 22 de maio de 2016

Grupos políticos que usam a religião não têm soluções

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

*Artigo de Padre Olmes Milani,
Missionário Scalabriniano

‘Amigas e amigos, agradeço por receber uma saudação de paz e esperança. Morando e trabalhando num país islâmico no qual a conversão dos cidadãos locais para o cristianismo ou outras religiões, significa ser passível de pena de morte, tenho acesso às publicações dos estudiosos dos países seguidores do Islã.  Lendo jornais, livros e revistas publicados a partir das Arábias, percebe-se que as conclusões e interpretações da conjuntura atual têm um colorido diferente daquele dos autores ocidentais. Estamos acostumados a ouvir especialistas cristãos ou ocidentais falarem sobre os grupos políticos que usam a religião. O que diria um estudioso islâmico sobre esse assunto?

O Dr. Abdul Hamid Al Ansari, numa palestra proferida recentemente a estudiosos e membros da mídia, afirmou que apesar das promessas de reformas e mudanças por parte de grupos políticos que usam a religião, uma vez no poder, são um fracasso. Confirma isso ilustrando o engodo da Fraternidade Islâmica, no levante da Primavera Árabe. Pergunta-se : Esses movimentos, incluindo a Fraternidade Islâmica, que possuem centenas de livros, têm teorias aplicáveis? Acrescenta que a Primavera Árabe revelou a verdade ao público sobre as mentiras de suas suposições. Na realidade, esse grupo só tem ideias e teorias, mas sem resultados.

Quando a Fraternidade Islâmica assumiu o poder, tinha alguma coisa chamada ‘Projeto Renascença’. Os cidadãos egípcios logo perceberam que não havia nada naquele projeto’, lembrou. Era baseado em teorias mais do que na praticidade.

Continuando sua explanação afirmou que ‘aqueles grupos políticos que usam a religião são oportunistas; tiram vantagens das sociedades descontentes. Seus programas e slogans são reacionários com a intenção de convencer o povo de que eles são a alternativa e a melhor solução. Portanto, eles aproveitam-se dos problemas sociais’, acrescentou.

Outra atitude desses grupos, afirmou o estudioso, é usar a religião como meio de monopolizar e formar suas bases de poder.

Afirma que ‘quando suas ideias e discursos são confrontados, presumem que seus opositores são contra o Islã e por isso querem impor sua hegemonia’.

Essas são as palavras severas de um estudioso seguidor do Islã, sobre os desmandos dos grupos que se aproveitam para chegar ao poder, usando a religião. Oxalá sejam uma inspiração para que teólogos e pregadores islâmicos, cristãos e de outras crenças não permitam que as religiões sejam trampolim, na conquista do poder.

Vale lembrar, aqui, as palavras do Mestre :

Eu deixo para vocês a paz, eu lhes dou a minha paz. A paz que eu dou para vocês não é a paz que o mundo dá’ (Jo 14,27).’


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sexta-feira, 20 de maio de 2016

Igreja caldeia : missão do clero no Iraque e na diáspora

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 

‘A Igreja caldeia promove um encontro do clero para relançar a obra pastoral e a missão no Iraque e entre as comunidades da diáspora. A iniciativa se dá em concomitância com o Ano da Misericórdia convocado pelo Papa Francisco e num período de crise profunda pelo qual passa o País do Golfo.

O encontro está programado para realizar-se nos dias 20 e 21 de junho próximo em Irbil, no Curdistão iraquiano, onde milhares de cristãos encontraram refúgio ao fugir de Mosul e da planície do Nínive com a ascensão, em 2014, do autoproclamado Estado Islâmico (EI).

O evento será também ocasião para repensar a obra de evangelização e o papel do sacerdote na comunidade, escreveu o Patriarca de Babilônia dos Caldeus, Dom Louis Rafael I Sako.


Missão da Igreja caldeia e papel do clero no Iraque

Num documento publicado no site do Patriarcado, e reportado pela agência missionária AsiaNews, Dom Sako ressalta a exigência de ‘relançar’ a missão da Igreja caldeia e o papel do clero no país. Ele evoca os ensinamentos contidos no Evangelho, em vista de um ‘despertar humano, espiritual e nacional’ diante dos ‘desafios atuais, os riscos e as tentações’.


Forte crise de identidade da comunidade cristã, agravada pelo êxodo

O Iraque está atravessando um período de profunda crise, não somente política devido ao impasse das instituições e da crise de governo, mas também em nível social e da segurança, com ataques contínuos na capital e em outras áreas do país fazendo centenas de vítimas entre a população civil.

A própria comunidade cristã vive uma forte crise de identidade, agravada com o êxodo – na última década – de quase metade da população em busca de amparo no exterior.


Interpelações sobre a vocação sacerdotal e impacto na missão de hoje

As ‘rápidas mudanças’ que se registram na política e no social, observa Dom Sako, e que registraram uma escalada ‘a partir da queda do regime’ de Saddam Hussein em 2003, ‘alcançaram todos os aspectos da vida, inclusive dos sacerdotes’.

Uma alteração profunda que ‘suscitou’, acrescenta, ‘múltiplas interpelações fundamentais’ que incidem ‘na vocação sacerdotal e têm impacto na missão de hoje’.

O futuro da Igreja caldeia ‘depende, em primeiro lugar, da qualidade de seu clero’, e seus líderes devem encontrar ‘um novo estilo na administração e na formação/ensinamento’, para responder aos problemas que surgiram no Iraque e nas comunidades da diáspora, explica o Patriarca.


Como viver a vocação e a missão no Iraque

Em seguida, Dom Sako oferece uma série de questões sobre as quais refletir em preparação para o encontro de junho em Irbil : como ‘viver a vocação e a missão’ em ‘circunstâncias imprevisíveis’; como ‘testemunhar o Evangelho’ com ‘alegria, esperança, lealdade e admiração’; usar as homilias para ‘influenciar de modo positivo’ o coração e o ânimo dos paroquianos; por que cada vez mais fiéis se unem aos grupos evangélicos; se essa crise se deve à ‘indiferença’ ou ‘abandono’ dos sacerdotes.

E ainda, o tema da inculturação, o encontro com os não-cristãos e como conciliar o empenho pastoral com o chamado à oração e à meditação.


O clero deve ser um sinal de esperança para os fiéis

Analisando o papel do clero, o Patriarca caldeu recorda o chamado evangélico ‘ao amor, ao serviço, ao cuidado para com os mais vulneráveis’, e a ser sempre ‘um sinal de esperança’ para os fiéis.

Ademais, faz uma advertência contra aqueles que ‘usufruem da autoridade’ que deriva da posição para ‘favorecimento pessoal’, que acaba por prejudicar a Igreja e minar seus fundamentos.

O Patriarca de Babilônia dos Caldeus pede também a todos os membros da comunidade caldeia que olhem para Cristo, seguindo ‘com o exemplo’ os princípios e os valores pregados.

Por fim, o Patriarca convida seus sacerdotes a não procurar um modelo ‘ideal’, mas a ‘admitir que cometemos erros’ que devem ser reconhecidos e aos quais é necessário corrigir, ao invés de ‘acumular segredos’.

Em vista do encontro, pede a todos que ‘se preparem de modo sério’, que deverá ‘reforçar a vocação’ e dar um novo impulso à missão da Igreja.’


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terça-feira, 17 de maio de 2016

Virgem de Madhu, conselheira da paz

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

*Artigo de Fernando Félix, 
Jornalista


Todos os anos, centenas de milhares de cingaleses vão em peregrinação ao santuário mariano de Madhu, o templo católico mais importante do Sri Lanka. Ali vão católicos, hindus e muçulmanos, porque é símbolo da paz nacional e pessoal reconquistadas.


‘Quando, em 2015, o Papa Francisco peregrinou ao santuário mariano de Madhu, no Sri Lanka, sublinhou que Nossa Senhora do Bom Conselho ali venerada guia o país para a reconciliação total. Durante a celebração rezou-se uma oração em várias línguas pedindo a consolidação da paz, por intercessão da Mãe que ali e desde ali tem sido companheira das famílias perseguidas por questões religiosas e afligidas pela guerra civil.


Nossa Senhora companheira na perseguição

O Santuário de Nossa Senhora de Madhu está situado na cidade de Madhu, que fica a 250 quilômetros ao norte da capital, Colombo. A região é habitada sobretudo pelo povo tâmil. O santuário faz parte da diocese de Mannar, formada por 34 paróquias servidas por 55 sacerdotes.

As origens do Santuário de Nossa Senhora de Madhu remontam a 1544. Nesse ano, o rei Jaffna mandou massacrar 600 cristãos de Mannar. Eram o fruto da ação evangelizadora dos portugueses chegados, em 1505, à ilha de Ceilão (assim se chamava, na época, o Sri Lanka). O monarca temia a expansão da influência portuguesa. Os fiéis que conseguiram escapar à chacina erigiram no mato nas proximidades de Madhu um pequeno lugar de oração. Ali erigiram a estátua de Nossa Senhora do Bom Conselho.

Em 1583, os cristãos sofreram nova perseguição. Os que se puderam proteger da fúria construíram uma igreja em Mantai, na península de Jaffna, que foi casa da estátua de Nossa Senhora de Madhu até meados do século XVII.

Em 1656, os holandeses calvinistas que desembarcaram em Ceilão aliados ao monarca, empreenderam uma violenta perseguição aos católicos. Durante catorze anos, trinta famílias católicas foram de aldeia em aldeia à procura de refúgio, levando consigo a estátua de Nossa Senhora e, em 1670, estabeleceram-na, definitivamente, em Maruthamadhu, no lugar onde se ergue atualmente o santuário. Outros católicos juntaram-se às vinte famílias. Entre eles havia uma mulher portuguesa, chamada Helena, que providenciou a construção da primeira igreja dedicada a Nossa Senhora de Madhu no interior da selva. A partir de então, difundiu-se por toda a ilha a fama de Nossa Senhora de Madhu, como curadora e protetora, em particular das mordeduras de serpentes.

A chegada ao Ceilão, em 1687, de S. José Vaz, sacerdote nascido em Goa, então território português, fez com que o catolicismo reflorescesse. E Madhu tornou-se, em 1706, um centro missionário.

Em 1872 – mais de trezentos anos depois da chacina dos primeiros cristãos de Madhu – foi colocada a primeira pedra da atual igreja do santuário. O local tornou-se lugar de oração respeitado e frequentado por fiéis católicos e também de outras religiões do Sri Lanka, prestando respeitosos tributos à Mãe Maria. O Vaticano reconheceu o seu valor e, em 1924, a estátua da Virgem de Madhu foi coroada pelo legado pontifício em nome do Papa Pio XI e, em 1944, a igreja foi consagrada.


Nossa Senhora refúgio na guerra

Durante a guerra civil do Sri Lanka – de 1983 a 2009 –, a zona do santuário não foi poupada aos combates entre os rebeldes tâmiles e as forças governamentais. Mas os bispos do país conseguiram fazer de Madhu uma zona desmilitarizada, garantindo a segurança dos peregrinos e dos numerosos refugiados que acorreram a essa área, fugindo da guerra. Com efeito, a partir de 1990, os 160 hectares dos terrenos do santuário acolheram milhares de deslocados, convertendo-se em campo de refugiados, reconhecido como tal pelas partes em conflito. No entanto, isso não impediu os massacres ocorridos ali, como o de Novembro de 1999.

Ao longo de 2001, a imagem de Nossa Senhora de Madhu foi levada em peregrinação a todos os cantos do país. Foi uma peregrinação penitencial. Três anos depois, começaram as negociações de paz que se concluíram em 2009, com a paz definitiva. Por isso, os Cingaleses vêem em Nossa Senhora de Madhu um símbolo de paz.


As peregrinações

A festa oficial de Nossa Senhora de Madhu é a 2 de Julho. Todavia, a celebração que atrai mais multidões é a Festa da Assunção a 15 de Agosto. Nesta data, a imagem é levada em procissão. E nesta prática evoca-se uma crença nascida durante a guerra civil. Dizia o povo que se a coroa de Nossa Senhora de Madhu caísse durante a procissão, isso significaria que a luta iria continuar.

Há uma série de outras lendas associadas ao santuário de Madhu, sobretudo relacionadas com as serpentes. Diz-se que, quando S. José Vaz chegou a Madhu, as cobras fugiram da área, retornando somente quando Nossa Senhora foi levada para longe, por razões de segurança, durante a guerra civil. E que, quando Nossa Senhora de Madhu regressou, as cobras foram expulsas mais uma vez.

Na entrada da igreja, num grande letreiro está escrito «ave-maria» em português, cingalês e tâmil. No espaço circundante da igreja existe uma via-sacra.

No interior da igreja, os peregrinos, de pé ou de joelhos, aproximam-se de Nossa Senhora, apresentam-lhe as suas intenções e oferecem-lhe flores – uma prática também característica do culto em templos budistas e hindus.

No piso abre-se um poço no local onde S. José Vaz celebrou missa. São-lhe atribuídas propriedades curativas, e as suas águas são usadas, principalmente, como antídoto para as mordeduras de serpentes. Outras tradições relacionadas com o terreno do santuário de Madhu são misturar porções do solo com o cimento das fundações das casas católicas, ou dissolver terra na água que os peregrinos tomam.

Ao longo do ano, os peregrinos vão, habitualmente, por vários dias, e ficam hospedados em albergues especialmente reservados para eles. Nas peregrinações, o álcool é proibido, assim como as danças e qualquer tipo de convívio popular. Os peregrinos costumam adquirir medalhas, escapulários e imagens de Nossa Senhora de Madhu, que um padre abençoa.’


Fonte :
* Artigo na íntegra

domingo, 15 de maio de 2016

Em diálogo pelo bem

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 *Artigo de Dom Walmor Oliveira de Azevedo,
Arcebispo Metropolitano de Belo Horizonte, MG


‘A tarefa de construir o bem comum necessita, acima de tudo, de diálogo.  Dialogar qualifica a capacidade humana de se dirigir ao outro, nas diferenças e nos parâmetros racionais das oposições. Permite também estabelecer uma relação com a lucidez de discernimentos e escolhas. Trata-se de prática que não oferece espaço para o ódio, vinganças e o aproveitamento espúrio de oportunidades para obter ganhos na contramão do bem comum. A ausência do diálogo permanente, em todas as esferas das relações humanas, explica o nascimento de descompassos, as mazelas de escolhas, os absurdos dos procedimentos que comprometem legalidades e produzem os leitos da corrupção.

Somente pela via do diálogo os muitos segmentos da sociedade construirão o tecido de uma cultura que sustente princípios e legalidades. As guerras, os acirramentos partidários, o recrudescimento da violência, os fundamentalismos - religiosos e políticos -, as inimizades, as crises familiares, tudo advém de incompetências humanas na essencial capacidade para dialogar. Uma qualidade fundamental para se escolher bem, decidir e garantir rumos adequados. Quando falta a indispensável competência da reciprocidade conquistada pelo diálogo, as consequências são sempre desastrosas.

Só o diálogo constrói entendimentos que levam à compreensão das mudanças e transformações tão velozes neste tempo. A vivência desse exercício mostra a importância da participação cidadã. Garante lucidez na condução de processos e engradece a alma, fazendo-a apreciar o que se baseia no altruísmo. Sem a abertura para a reciprocidade nos exercícios relacionais em diferentes ambientes - do aconchego da vida familiar aos grupos religiosos, culturais e políticos -, o que se faz torna-se desserviço. Líderes incapacitados para o diálogo, particularmente no âmbito da política, são obstáculos nos funcionamentos da sociedade, prejudicando o bem comum.

O diálogo, longe de ser ‘conversa fiada’, fofoca, palavras trocadas pelo simples gosto de falar - especialmente aquele gosto muito comum de se falar dos outros -, é a construção de entendimentos que dão suporte para a criação e manutenção do ethos do altruísmo, da seriedade no que se faz e da busca pela verdade. Promove, assim, a coragem da transparência, em todos os sentidos e níveis, balizando na honestidade relações e funcionamentos. A qualidade do diálogo depende muito da visão construída no horizonte dos cidadãos, para além de paixões partidárias. O exercício do diálogo alarga a visão de mundo do cidadão, os horizontes dos funcionamentos institucionais. Permite alcançar a compreensão que anima a indispensável autoestima, a consciência histórica e a configuração política merecedora de credibilidade.  Nesse sentido, o diálogo é força para fazer com que a sociedade seja verdadeiramente democrática, capaz de respeitar e promover, com fecundidade, o bem comum.

Dialogar é o caminho da permanente construção da vida social, familiar e individual. O diálogo é remédio para curar irracionalidades, tônico que fortalece entendimentos cidadãos, intervenção que alarga as estreitezas de interpretações. O princípio do bem comum é o que deve nortear a sociabilidade, superando, assim, radicalismos e violências.  Para além de qualquer simples interesse, sobretudo daquele que nasce da idolatria do dinheiro, cada cidadão tem a tarefa de preservar e de promover esse princípio.

O respeito e a promoção do bem comum são deveres de todos.  Por isso, ecoe em todo canto, e permeie os tecidos da cultura na sociedade atual, na particularidade do momento vivido na sociedade brasileira, a autoridade do convite e da recomendação do Papa Francisco, dirigindo-se aos brasileiros : é preciso investir todas as forças no diálogo para reconstruções, respeito a legalidades e encontro das indispensáveis saídas, evitando descompassos que comprometam a civilidade, a ordem e a justiça. Acima de tudo, os segmentos diversos da sociedade, para superar mediocridades, partidarismos, radicalismos de todo tipo, fecundando nova cultura, precisam estar em diálogo pelo bem comum.’


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sexta-feira, 13 de maio de 2016

Maldição branca

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

*Artigo de Padre José Vieira,
Missionário Comboniano


‘O albinismo é uma doença rara hereditária caracterizada pela (quase) ausência de melanina, a proteína que gera os pigmentos que dão cor à pele, olhos e cabelo para proteger o organismo dos raios solares. As pessoas afetadas por essa patologia têm pele e cabelos muito claros.

O albinismo tem uma incidência maior na África Subsariana, embora esteja espalhado por todo o mundo e discrimine milhares de pessoas. Na Europa e na América, afeta uma em cada 17 a 20 mil pessoas, mas na África a sul do Sara a incidência é quatro vezes maior e na África Oriental 12 vezes.

Na África, as pessoas com albinismo são duplamente discriminadas. Por falta de proteção contra os raios ultravioletas, têm problemas de visão e sofrem graves queimaduras de pele. A maioria acaba por falecer de cancro entre os 30 e os 40 anos.

A superstição é outra ameaça : há famílias que matam os bebês com albinismo porque são considerados maldição; os feiticeiros, por seu turno, crêem que a pele branca tem poderes mágicos – e a das crianças ainda mais – e usam órgãos dessas pessoas para feitiços.

Ikponwosa Evo, perita independente da ONU para a defesa dos direitos humanos de pessoas com albinismo, publicou em março um relatório em que denuncia o cabo das tormentas que essas pessoas têm de dobrar.

«Mitos perigosos alimentam estes ataques contra pessoas inocentes : muitos acreditam erradamente que pessoas com albinismo não são seres humanos, mas fantasmas ou sub-humanos que não podem morrer, mas só desaparecem», disse na apresentação do relatório.

O documento denuncia que pessoas com albinismo são vítimas de graves mutilações e morte a machete para recolha de partes do corpo, incluindo dedos, braços, pernas, genitais e ossos, usadas em rituais de feitiços, poções e amuletos. Um negócio macabro : uma perna pode valer 1780 euros e um cadáver inteiro 66 850.

A perita nigeriana, que também tem albinismo, disse que entre agosto, quando assumiu o cargo, e março foram registados 40 ataques em sete países africanos, na maioria contra crianças. A Tanzânia e o Quênia são os países mais violentos para quem sofre da falta de pigmentação. No Malauí, grupos criminosos autodenominados «caçadores de albinos» estão ativos desde 2015 e desde janeiro já atacaram 34 pessoas e mataram 11.

Em Tete, Moçambique, sete crianças com albinismo foram raptadas desde dezembro. Lurdes Ferreira, porta-voz do comando distrital da polícia, disse que se trata de «um crime organizado transfronteiriço e por isso fomos incapazes de prender os raptores».

As campanhas eleitorais podem representar um perigo acrescido por haver registo de políticos que pedem a feiticeiros que os ajudem a ganhar e estes recorrerem a órgãos de pessoas que sofrem de albinismo para potenciar os feitiços como aconteceu no Gana, Senegal, Costa do Marfim e Quênia.

A senhora Evo propõe desenvolver e fortalecer medidas específicas para prevenir e pôr fim às agressões contra as pessoas com albinismo, incluindo campanhas de consciencialização e compreensão da sua condição e a definição de quadros jurídicos internacionais.’


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