quinta-feira, 4 de janeiro de 2018

Que haja paz, pão e fraternidade

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

Ao restringir o acesso dos não refugiados ao Estado o sistema deixa de garantir a migrantes os direitos humanos universais.
*Artigo de Élio Gasda, 
teólogo


‘Era dezembro de 1967, Paulo VI escrevia uma mensagem criando o dia Mundial da Paz, a ser festejado em 1º janeiro de cada ano. ‘A proposta de dedicar à paz o primeiro dia do novo ano não tem a pretensão de ser qualificada como exclusivamente religiosa ou católica. Antes, ela visa encontrar a adesão de todos os verdadeiros amigos da paz’. 50 anos se passaram e a data adotada por quase todas as nações do planeta pouco ajudou na construção da paz mundo afora.
Paz tem múltiplos significados. O Dia Mundial da Paz não celebra tão somente a paz relacionada à ausência de conflitos, mas também quer promover a transformação da realidade de muitas pessoas que sofrem com as desigualdades, a violência, a fome, a miséria, com o trabalho escravo, com a falta de conhecimento. A paz depende da inclusão social das pessoas. Para promover a paz é necessário muito mais que uma data. Paulo VI e seus sucessores definiram temas para o Dia Mundial da Paz que passaram pela promoção dos direitos humanos (1969), pela liberdade religiosa (1989), pelo combate à pobreza (2009) e pelo trabalho escravo (2015).
Em 2018, o tema escolhido pelo Papa Francisco foi ‘Migrantes e Refugiados : homens e mulheres em busca de paz’. Os termos migrantes e refugiados não são substituíveis entre si. Existe uma diferença legal. Os refugiados são os únicos migrantes dispensados de portar passaportes/documentos válidos para ingressar em território que não seja o seu de origem. Refugiadas são pessoas que estão fora de seus países de origem por perseguição, conflito, violência ou outras circunstâncias, e como consequência, necessitam de ‘proteção internacional’. Esse regime de proteção coloca barreiras e contribui para o discurso da ilegalidade da migração (pessoas que estão à procura de melhores condições de vida). Ao restringir o acesso dos não refugiados ao Estado o sistema deixa de garantir a migrantes os direitos humanos universais.
Existem mais de 250 milhões de migrantes no mundo. Dos quais 22 milhões são refugiados. Pessoas que foram forçadas a abandonar seus lares por causa de conflitos armados, pela violência generalizada, perseguição por questões raciais, étnicas, religiosas, políticas, históricas ou por desastres ambientais. Políticas internas e externas que articulam interesses meramente comerciais também estão entre as causas.
São os mais pobres os mais acolhedores. Dados fornecidos por ACNUR (Agência da ONU para Refugiados) mostram que a maior parte dos refugiados está em países de Terceiro Mundo. A região que abriga a maior parte deles é o continente africano, com 39%. Estimativa do Escritório da ONU para a Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA) aponta que 136 milhões de pessoas no mundo dependerão de ajuda humanitária em 2018. O número, 5% maior do que em 2017, representa 1 em cada 56 dos 7,6 bilhões de habitantes do planeta. E está subestimado, uma vez que a projeção do OCHA não inclui, por exemplo, as pessoas que fogem da violência em países da América Central perdem os meios de sobrevivência.
São histórias de sofrimento que se multiplicam. Migrantes e refugiados enfrentam o inferno para cruzar oceanos, desertos e montanhas. Encaram o tráfico humano. São exploradas de todas as formas. Arriscam a vida em busca de paz e dias melhores. E, muitas vezes, o drama permanece, não recebem apoio e não são acolhidos. ‘São homens e mulheres, crianças, jovens e idosos que procuram um lugar onde viver em paz’ (Bento XVI).
É preciso abraçá-los com misericórdia. ‘Maldito o que viola o direito do estrangeiro’ (Dt 27,19). Migrantes e refugiados ‘não chegam de mãos vazias : trazem uma bagagem feita de coragem, capacidades, energias e aspirações, para além dos tesouros das suas culturas nativas, e deste modo enriquecem a vida das nações que os acolhem. Todos conformam uma só família, migrantes e populações locais que os recebem. Todos têm o mesmo direito de usufruir dos bens da terra, cujo destino é universal, como ensina a doutrina social da Igreja’ (Papa Francisco). Os direitos humanos não têm pátria.
O próprio Jesus, juntamente com seus pais, arrisca a vida por segurança. Nascido pobre e como um sem-teto, foi perseguido, ainda criança, pelo poder de Herodes (Mt 2,13); migrou e tornou-se um refugiado no Egito. Papa Francisco, que comparou a fuga da Sagrada Família ao drama de milhões de refugiados, aponta ações como acolher (legalizar entrada), proteger (reconhecer e tutelar), promover (garantir instrução e desenvolvimento) e integrar refugiados e migrantes com as comunidades que os receberam para que, assim, encontrem a paz que tanto procuram.
 ‘Que Deus nos acorde de nossa indiferença, abra nossos olhos para aqueles que sofrem. Que sua ternura acorde nossa sensibilidade e faça nos sentirmos reconhecidos em todos aqueles que chegam a nossas cidades, nossas histórias e nossas vidas’ (Papa Francisco, Missa do galo 2017). ‘Não tenham medo, abram, aliás, escancarem as portas para Deus’( João Paulo II).

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